Ando assim
Sabe, você está certo. Eu não sou mesmo mais a mesma. Muita coisa
mudou em pouco tempo – talvez. É, as coisas mudam. Eu também mudei. Já não
penso como há alguns anos atrás, me sinto mais complacente e mais chata também. Desconfio
que isso é tornar-se adulto. Adulteci, então – ou não. Depois de um tempo, algumas
coisas passam a ter significado, já outras, perdem o sentido. Lembro da minha
pressa, do meu passo rápido tropeçando nos ponteiros do relógio. Bobice ter
pressa. Agora ando devagar que é pra enxergar os detalhes. Antes deixava meus
sonhos me levarem, hoje sou eu quem os leva – amarradinhos no dedo que é pra
não esquecer. Antes não sabia o que queria e, confesso, continuo sem saber –
nunca saberei. Mas, já sei bem o que não quero. Não quero muito, não quero
excessos. Quero bolsa leve, batom carmim, um coque frouxo no cabelo e um
sorriso despretensioso. Ando mais solta, sabe, mais leve e mais egoísta: ando pensando
mais em mim. Parei de correr atrás das pessoas e de tentar agradar. Em ausência,
somos mais notados. Hoje, cuido mais de mim – cuido mais dos outros. Desatei algumas
amarras, joguei janela afora as roupas velhas, desapeguei do lençol velho e
puído, doei os sapatos que já não me cabiam. Ando mais sagaz. Libertei alguns
monstros, deixei que seguissem seu desatino, a mim não assustam mais. Ando mais
comedida e mais inconsequente, ao mesmo tempo. Mudei de casa e de ares. Há muito
joguei fora o vestido bordado e o laço de fita, desabitei-me da rotina e dos
costumes de menina que aqui teimavam em viver. Moro, agora, em mim. Moro na
mulher que nasce, ainda meio torta, meio desajeitada. Vivo no que sinto e no
que busco. Sigo por outros caminhos, procuro outros rumos. Não quero mais me
encontrar, quero me perder. Me perdendo, talvez, encontre meu rumo, enfim. Impossível
não ver. Mudei de atitude e de vontades. Mudei das pessoas e de suas manias
fingidas. A vida vem e nos leva de qualquer jeito, escolhi não viver de
qualquer jeito. Ando brincando de ser gente grande, pregando peça na seriedade
do mundo. Tiro um coelho da cartola por dia, ando me surpreendendo. Ando com
fome. Fome de viver. – Simone Oliveira
"Estou mais atrevida, mordaz e ferina. Estou cheia de vida, sagaz e ladina. Já não sou mais a mesma. Respiro outros ares. Navego outros mares. São tantos olhares, convites, sorrisos. Eu gosto, eu preciso, pois é..." ♪
(Atrevida - Simone Bittencourt de Oliveira)
Comentários
Como dizia Caio: Arrumar as gavetas, jogar as coisas fora...!!
Um beijo!!