Divã
¾ Um tempo. Achei
que seria a melhor solução no momento pra nós dois. Ou, pelo menos, seria o
necessário. Muita coisa mudou, sabe, depois das merdas que ele andou fazendo. Eu
já não sou mais a mesma. Nem ele. Tentei, e muito, adiar esse momento, mas não
deu. Nossos limites estouraram e, no meio de todos esses destroços, a gente se
perdeu.
¾ De
novo? Foi o que eu perguntei a ela. Mais um final mal resolvido e mais um tempo
indeterminado onde a gente fica longe se cobrando, maldizendo e discutindo,
como se estivéssemos juntos. Eu só queria que ela soubesse que eu fiz mesmo
muitas merdas. Eu sei, eu sei que não foram poucas e que não faz lá muito
tempo. Mas eu só queria que ela soubesse que eu já paguei um preço bem caro por
isso: estraguei o nosso amor. E é nisso que penso todas as noites – e ela não
sabe.
¾ Quando a
gente se conheceu? Ah, nem lembro direito como tudo começou. Quando me dei
conta, já era tudo isso sem a gente nem perceber. E, sem querer, foi. É. Eu não
queria, confesso. Sempre achei ele meio nada-haver-comigo, sabe. Meio menino,
meio imaturo. Mas, ele tem o sorriso lindo e eu nunca tinha reparado nisso. Aliás,
ele era meu quase-vizinho, e eu nem sabia. Enfim, as coisas foram indo e eu deixei
ele chegar. Depois não quis mais que ele fosse embora.
¾ Ela passava todos
os dias pela minha rua quando voltava do trabalho. E eu esperava todas as
tardes pra ver ela passar. Achava bonito o jeito dela, de não olhar pra
ninguém, enquanto os cabelos soltos dançavam sobre as costas. Isso me
hipnotizava. Um dia, tomei coragem e pedi seu telefone. Esperei um não e recebi
um sorriso, que me fez suar. Ela não me deu o telefone de primeira, mas foi aí
que tudo começou.
¾ Não gosto
quando ele fala palavrões, acho feio. Também não gosto quando ele desliga o
telefone na minha cara depois de uma discussão. Não gosto da mania que ele tem
de achar que está sempre certo e, pior, detesto quando ele realmente está
certo. Não gosto da mania que ele tem de mexer no cabelo e sorrir meio de
canto. Sinto ciúmes.
¾ O que eu não
gosto nela? Não gosto quando ela diz que o barco está furado e não vê que estou
remando feito um louco, sem parar. Ela é teimosa e dificilmente volta atrás,
não gosto disso. Não gosto quando ela fala ‘ok’ – essas respostas curtas me
tiram do sério. Não gosto quando ela me ignora – ela sabe fazer isso muito bem.
E detesto ler o que ela escreve.
¾ Lembrei dele
anteontem, na sorveteria. Meu sorvete ficou solitário sem o dele pra misturar. Era
domingo. E domingo é sempre dia da saudade, deve ter sido isso. Não teve briga
pelo morango e nem abraços em casa, no final. Só nossa música preferida tocando
pelo resto da noite.
¾ A última vez
que lembrei dela? Você não pode contar isso a ela, pode? Eu lembro dela todos
os dias e todas as noites, principalmente. Mas, ontem eu senti mais falta. Ontem
alguém passou por mim com o mesmo perfume que ela usa e eu senti vontade de
largar tudo e jogar pedrinhas lá na janela dela só pra ver ela desgrenhada e de
mau humor.
¾ Do que mais
gosto? Quando ele me olha com cara de menino e pede proteção. Gosto da sua
risada e das brincadeiras na cozinha quando vamos fazer pipoca. Gosto quando
ele faz me sentir mais importante que os jogos de quarta à noite. Gosto de um
jeito todo particular da voz meio rouca, meio mansa quando diz que não vai mais
me deixar.
¾ Eu gosto
quando ela me manda mensagens carinhosas pela manhã. Gosto quando ela me acorda
e quando me faz dormir. Gosto quando ela diz que nunca amou outro homem como a
mim, quando diz que comigo é diferente. Gosto quando ela me pega nesses
clichês. Ah, e eu gosto de vê-la zangada, ela fica perigosamente mais linda.
¾ O que me
deixa mais triste? Ah, sei lá, saber que a gente pode se perder de vez e nunca
mais se encontrar. Olhar pra trás e ver tanta coisa boa manchada de mágoa, de
nódoas que parecem que nunca vão sumir. Nosso amor tão bonito, hoje todo
machucado. O triste é chorar ao ver nossas fotos sorrindo.
¾ Putz... Ela chorando.
Foi o que sempre me deixou mais triste. Logo ela, tão centrada, tão segura, tão
forte. Ela chorando sempre me quebrou as pernas. Pensar em tudo que eu fiz, no
que não fiz e no que tudo isso deu. O mais triste é não ter mais seu sorriso de
antes, é ter jogado fora momentos que daria tudo, hoje, para viver.
¾ Na verdade,
eu não sei o que eu acho. Eu não acredito nessa de alma gêmea, nem de pessoas
pré-destinadas uma à outra. O destino é o acaso. Meu lado meio cético não me faz
crer nesses amores eternamente arrebatadores. O ‘felizes para sempre’, pra mim,
inclui muitas pedras ao longo do caminho. Mas, existe alguma coisa entre a
gente que não se perde. Existe algo nele que eu sempre vou amar. Existe algo em
mim que me faz querer ser sempre dele. E, por mais que a gente fuja, essa
coisa, isso que liga a gente, faz de novo a gente se encontrar.
¾ É como se
ela me conhecesse por dentro. Você já teve essa sensação? O que significa isso?
É como se nenhum colo nos meus braços se encaixasse tão perfeitamente como o dela.
É confortante sentir o perfume dos seus cabelos espalhados pelo meu peito. Me traz
paz, entende? E, por mais que eu siga sem rumo e faça besteiras de vez em
quando eu sei que ela é a única que pode me salvar. Eu só queria que ela
soubesse que é nela que eu penso todas as noites. E que, de todas as merdas que
eu fiz, a maior delas foi ter deixado ela ir embora.
Comentários
Eu terminei esse texto com uma exclamação imensa e os olhos brilhando de orvalho.
Entendi o marcador, entende? Lindo de doer, Si. Tocou fundo.
beijos
Esse texto é tudo o que estou vivendo no momento. Eu me li nesse texto.
- Incrivelmente lindo !
Lindo...e profundo...
e que relacionamentos nem sempre são perfeitos,às vezes, eles se quebram pra gente poder consertar
@blogabs | Emilie Escreve
Li gole a gole, saboreando cada sacada que você colocou ali, cada frase inteligente, cada trecho de suspirar.
Lindo demais.
Me trouxe lembranças...
Beijos.
que lindoO