Ela só é feliz no sol


Se chove lá fora, o mundo é pequeno demais debaixo do seu guarda-chuva. Porque, se o tempo fecha e o céu faz cara feia, o coração dela fica miúdo e se encolhe todo por dentro. Na sombra das nuvens escuras, ela se desfaz dos seus medos pra ocupar seus lugares e se enrosca no labirinto turvo que são suas doces e claras lembranças. Ela é triste quando as gotas do céu batizam sua dor.
Se os trovões gritam pro mundo sua fragilidade, ela se esconde nas cobertas feito criança de três anos. Se chove e escurece, ela fica triste. Seus olhos escuros desafiam o breu da noite. Qual deles esconde mais mistérios? É dela o frio que pula a janela e faz cócegas nas cortinas. É dela o brilho escondido das estrelas por entre o nublar do céu da noite antecipada. É só dela o quarto fechado e as recordações presas a sete chaves dentro da gaveta bem lá no fundo do coração.
Ela é leve feito pena. Ela é feito balão ao encontro do infinito, quando sobe feliz-feliz céu afora à procura do que aqui embaixo não vai encontrar. Ela é vento nos cabelos e calor no rosto. A moça escreve de madrugada pra espantar os pensamentos e guardá-los no papel antes de dormir – e para dormir. Ela tem olhos de noite, mas detesta a escuridão.
E, quando o primeiro raio de sol irradia seu brilho meio desconfiado janela adentro, ela se desfaz das amarras, do frio e dos medos, a prisão abre as portas e a liberdade chama lá fora toda oferecida que é. É que ela só é feliz no sol, de cara pro vento e sorriso estampado pro resto do mundo. Avisa que a moça já vai. E, se chover, ela nem liga, amanhã tem sol de novo e seca o que molhar.

Comentários

Deise Lima disse…
Que delícia de texto, Simone!!!
Cheiro de brincadeiras com as palavras, muito bom de ler!
Ainda bem que faz mais sol do que chuva, porque é muito bom ver uma moça feliz brilhar por aí!
Abraço!

Postagens mais visitadas deste blog

Que bom que você veio..

Apenas

Das verdades mal (ditas)