Seu calor provoca a minha cura

Ele disse que me queria mais perto. Eu também queria, mas não disse. Na verdade, eu nunca digo, é que perto dele eu fico muda. Foi quando ele me abraçou e eu senti seu coração bater um pouco mais fora do compasso. Ninguém tem aqueles olhos, ninguém esconde o mundo por trás do olhar como aquele rapaz. Perdi o fôlego. É isso que acontece quando, tão de perto, ele me sorrir meio de canto. Tenho certeza que quando Deus jogou por aí meu manual de instruções esse moço achou perdido em algum lugar. Ele não pode acertar tanto.

Ele disse que estava com saudades. Eu também estava, mas não disse. Na verdade, quando o seu cheiro levemente amadeirado me envolve, eu não digo mais nada. O moço também sabe falar sujeiras no meu ouvido, e no roçar da sua barba por fazer pelo meu rosto eu prefiro o silêncio das nossas respirações a dançar no mesmo passo. E o céu vira cenário de nós dois. As estrelas brilham sorridentes. E a noite vai caindo feito um lençol de seda sobre o mundo - que é só nosso.

Ele disse que queria que eu ficasse. Eu também queria ficar. Mas não disse. Calei sua boca com um dos dedos e ali fiquei, como se tivesse medo que ele fugisse ou, de repente, sumisse do nada assim como apareceu. Ele me olhou feito menino indefeso. Foi a primeira vez que vi seus olhos meio perdidos, e foi aí, no vácuo da sua busca que eu me encontrei. Naquela noite estrelada, de brisa leve e abrasadora, nos encontramos. Nessa noite, por trás das cortinas abertas dos seus olhos, que eu me mostrei.

Ninguém veste tão bem a simplicidade como aquele moço. Ninguém consegue ser tão perfeito sendo tão errado. Até hoje não desvendei o mistério que ele esconde, nunca entendi como ele me domina tão bem. Talvez seja a mania que ele tem de sujar minha poesia e desarmonizar o meu verso. E nas palavras quentes da sua rima ele se torna o meu melhor poeta. Seu calor provoca a minha cura. E daquelas noites frias já nem me lembro mais.